Pesquisador discute infanticídio indígena à luz da Bioética
Prática comum em algumas comunidades indígenas
não pode ser considerada como crime, pois faz parte da cultura tradicional
Da Secretaria de Comunicação da UnB
O tema do infanticídio indígena foi objeto da dissertação de Saulo Ferreira Feitosa, mestre em Ciências da Saúde com a pesquisa Pluralismo Moral e Direito à Vida: apontamentos bioéticos sobre a prática do infanticídio em comunidades indígenas do Brasil. O autor promove uma discussão bioética sobre uma prática tradicional. Ele defende a autonomia dos povos indígenas e explica que qualquer intervenção nos costumes tradicionais deve considerar a cultura de cada povo. “A dissertação não defende o infanticídio, mas a legitimidade da autonomia desses povos”, diz Saulo.
“Para que haja o infanticídio, é preciso que haja nascimento. Infanticídio é uma categoria da sociedade branca que se refere ao ato de matar uma criança”, afirma. Segundo o pesquisador, os eventos que ocorrem entre os povos indígenas não podem ser equiparados ao que acontece na sociedade ocidental. “O que acontece nas comunidades indígenas são ‘interditos de vida’ antes que o nascimento ocorra, já que o nascimento em alguns povos é cultural”, explica. Para algumas comunidades, o fato de nascer biologicamente não significa ter nascido. “Para o indígena, o nascimento não é biológico, é social”, afirma Volnei Garrafa. Professor e pesquisador explicam que o ato de nascer não está vinculado ao parto. Logo, não se pode considerar o interdito como morte.
Há no Brasil, pelo menos 240 povos indígenas catalogados. Destes, cerca de oito praticam o “interdito de vida”. Normalmente, são comunidades mais afastadas, que têm pouco ou nenhum contato com a sociedade branca. O pesquisador propõe a discussão do tema sob uma ótica científica e defende que essa prática só pode ser interrompida a partir de uma intervenção que respeite a identidade de cada povo. “Intervenção é diferente de intromissão. Por meio de políticas públicas de assistência ao indígena e de discussão de direitos humanos, é possível promover o fortalecimento de aspectos que reforcem os mecanismos de proteção à criança dentro da comunidade”, defende Saulo.
“Bioética é a ética aplicada”, diz Volnei Garrafa quando explica que a dissertação conseguiu dar uma resposta concreta a uma questão que é julgada sob um ponto de vista ocidental. A partir da Bioética de Intervenção, a corrente escolhida por Saulo para abordar o tema, qualquer interferência feita nas comunidades indígenas deve respeitar as tradições dos povos. O pesquisador defende a autonomia da prática de tradições indígenas. “Cabe a cada povo definir os rumos de seus hábitos e costumes”, diz.
Volnei explica a importância de perceber as diferenças culturais entre as leis e práticas ocidentais e as dos povos indígenas. “É preciso perceber as nuances, considerar o pluralismo cultural”, afirma. Saulo conta que algumas “intromissões” feitas por pessoas de fora da comunidade tiveram resultados desastrosos, como rejeição e até morte de crianças.
Um caso publicado pelo Conselho de Medicina de São Paulo descreve a “intromissão” de um médico num caso de gravidez de gêmeos. Segundo o costume do povo, por uma questão de cosmologia, só o gêmeo “do bem” deveria sobreviver. Um dos gêmeos, o “do mal”, deveria ser sacrificado. "Os gêmeos seriam o sol e a lua. E o sol e a lua não podem conviver”, explica Saulo. Para evitar a morte de uma das crianças, o médico omitiu da mãe que ela tinha dado à luz a duas crianças e entregou a ela apenas uma. A outra seria cuidada por um funcionário contratado. A mãe ficou sabendo do que aconteceu a sacrificou a criança que estava com ela. A sobrevivente retornou à tribo e ficou aos cuidados da avó materna, sendo rejeitada por todos os seus pares.
A partir de 2005, grupos de religiosos evangélicos começaram a levantar a discussão sobre o infanticídio, alegando que deveria haver leis específicas para punir esse tipo de prática dos povos indígenas. Em 2007, a Lei Muwaji foi proposta pelo Deputado Henrique Afonso (PT/AC), sugerindo “o combate a práticas tradicionais nocivas e à proteção dos direitos fundamentais de crianças indígenas, bem como pertencentes a outras sociedades ditas não tradicionais”.
O infanticídio já existe no código penal e os indígenas estão submetidos à legislação brasileira. “Não tem cabimento uma lei elaborada especificamente para os indígenas”, diz Saulo Feitosa. Em sua pesquisa, ele procurou legitimar as práticas tradicionais de grupos indígenas, conferindo-lhes o direito de autonomia, uma vez que suas tradições não se originam dentro da sociedade ocidental, não sendo possível sujeitá-las à ética e à moral dessa sociedade.
“Para que haja o infanticídio, é preciso que haja nascimento. Infanticídio é uma categoria da sociedade branca que se refere ao ato de matar uma criança”, afirma. Segundo o pesquisador, os eventos que ocorrem entre os povos indígenas não podem ser equiparados ao que acontece na sociedade ocidental. “O que acontece nas comunidades indígenas são ‘interditos de vida’ antes que o nascimento ocorra, já que o nascimento em alguns povos é cultural”, explica. Para algumas comunidades, o fato de nascer biologicamente não significa ter nascido. “Para o indígena, o nascimento não é biológico, é social”, afirma Volnei Garrafa. Professor e pesquisador explicam que o ato de nascer não está vinculado ao parto. Logo, não se pode considerar o interdito como morte.
Há no Brasil, pelo menos 240 povos indígenas catalogados. Destes, cerca de oito praticam o “interdito de vida”. Normalmente, são comunidades mais afastadas, que têm pouco ou nenhum contato com a sociedade branca. O pesquisador propõe a discussão do tema sob uma ótica científica e defende que essa prática só pode ser interrompida a partir de uma intervenção que respeite a identidade de cada povo. “Intervenção é diferente de intromissão. Por meio de políticas públicas de assistência ao indígena e de discussão de direitos humanos, é possível promover o fortalecimento de aspectos que reforcem os mecanismos de proteção à criança dentro da comunidade”, defende Saulo.
“Bioética é a ética aplicada”, diz Volnei Garrafa quando explica que a dissertação conseguiu dar uma resposta concreta a uma questão que é julgada sob um ponto de vista ocidental. A partir da Bioética de Intervenção, a corrente escolhida por Saulo para abordar o tema, qualquer interferência feita nas comunidades indígenas deve respeitar as tradições dos povos. O pesquisador defende a autonomia da prática de tradições indígenas. “Cabe a cada povo definir os rumos de seus hábitos e costumes”, diz.
Volnei explica a importância de perceber as diferenças culturais entre as leis e práticas ocidentais e as dos povos indígenas. “É preciso perceber as nuances, considerar o pluralismo cultural”, afirma. Saulo conta que algumas “intromissões” feitas por pessoas de fora da comunidade tiveram resultados desastrosos, como rejeição e até morte de crianças.
Um caso publicado pelo Conselho de Medicina de São Paulo descreve a “intromissão” de um médico num caso de gravidez de gêmeos. Segundo o costume do povo, por uma questão de cosmologia, só o gêmeo “do bem” deveria sobreviver. Um dos gêmeos, o “do mal”, deveria ser sacrificado. "Os gêmeos seriam o sol e a lua. E o sol e a lua não podem conviver”, explica Saulo. Para evitar a morte de uma das crianças, o médico omitiu da mãe que ela tinha dado à luz a duas crianças e entregou a ela apenas uma. A outra seria cuidada por um funcionário contratado. A mãe ficou sabendo do que aconteceu a sacrificou a criança que estava com ela. A sobrevivente retornou à tribo e ficou aos cuidados da avó materna, sendo rejeitada por todos os seus pares.
A partir de 2005, grupos de religiosos evangélicos começaram a levantar a discussão sobre o infanticídio, alegando que deveria haver leis específicas para punir esse tipo de prática dos povos indígenas. Em 2007, a Lei Muwaji foi proposta pelo Deputado Henrique Afonso (PT/AC), sugerindo “o combate a práticas tradicionais nocivas e à proteção dos direitos fundamentais de crianças indígenas, bem como pertencentes a outras sociedades ditas não tradicionais”.
O infanticídio já existe no código penal e os indígenas estão submetidos à legislação brasileira. “Não tem cabimento uma lei elaborada especificamente para os indígenas”, diz Saulo Feitosa. Em sua pesquisa, ele procurou legitimar as práticas tradicionais de grupos indígenas, conferindo-lhes o direito de autonomia, uma vez que suas tradições não se originam dentro da sociedade ocidental, não sendo possível sujeitá-las à ética e à moral dessa sociedade.
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Textos: UnB Agência. Fotos: nome do fotógrafo/UnB Agência.
Fonte: http://www.unb.br/noticias/unbagencia/unbagencia.php?id=2987